sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O Partido Socialista e a Actividade Mineira no Alentejo




Em Declaração Politica na AR sobre a situação das Pirites Alentejanas, José Soeiro denunciou a cumplicidade do Governo com todo o processo "cada vez mais nebuloso e opaco" e questionou a razão da recusa da "entrega dos documentos já requeridos por várias vezes pelo GP do PCP (...) relativos aos negócios do Estado com a Eurozinc envolvendo as Pirites e a Somincor". (...) O cabal esclarecimento de tudo isto continua a impor-se! Os interesses dos trabalhadores e do País assim o exigem."

Declaração Política sobre as Pirites Alentejanas- Intervenção de José Soeiro na AR

Senhor Presidente

Senhoras e Senhores Deputados

A 19 de Maio de 2008, há apenas sete meses, repito, apenas sete meses, o 1º Ministro José Sócrates, acompanhado do Ministro da Economia Manuel Pinho, apontavam aos portugueses, com grande pompa e circunstância, a Lundin Mining como o exemplo de modernidade capaz de "competir na economia global e fazer aquilo que é necessário ao País". E proclamava, confiante, "esta mina trouxe investimento, deu trabalho e vai contribuir para aumentar as exportações" nacionais.

João Carrelo, vice-presidente da Lundin Mining, garantia que as Pirites iriam trabalhar pelo menos durante 10 anos, iria haver mais investimento e mais emprego, porque o Grupo estava apostado na exploração mineira em Portugal.

Em Dezembro de 2007 trabalhavam nas Pirites Alentejanas, segundo Manuel Pinho, 980 trabalhadores.

Na manhã de 13 de Novembro, pouco mais de cinco meses depois, sem qualquer pré-aviso aos trabalhadores, aos seus legítimos representantes ou à autarquia de Aljustrel, o anúncio brutal e com efeitos imediatos, as Pirites Alentejanas paravam nesse mesmo dia a sua laboração e ao seu serviço iriam ficar apenas algumas dezenas de trabalhadores para assegurar a sua manutenção.

Quem aceitasse a brutal decisão e rescindisse do contrato nos sete dias imediatos, receberia 3 meses de salário, quem o não fizesse seria simplesmente despedido a partir de 20 de Novembro sem qualquer direito, como se de uma qualquer peça descartável se tratasse.

A esta chantagem inqualificável, a este prepotente e efectivo despedimento colectivo, ainda que encapotado, chamou ontem o senhor Ministro da Economia Manuel Pinho de "rescisões amigáveis" afirmando não se ter verificado qualquer despedimento.

Que vergonha. Que vergonha ouvir um Ministro de um Governo que se diz socialista, dizer uma tal barbaridade. Vergonha que devia fazer corar o Grupo Parlamentar do PS sempre tão empenhado em aplaudir um Ministro que há muito devia ter sido afastado da governação. Assim tivessem José Sócrates e o PS um mínimo de respeito pelos trabalhadores, pelos seus direitos, problemas e dificuldades. Assim tivessem José Sócrates e o PS como prioridade da sua governação os interesses de quem trabalha e os interesses do País em vez dos interesses das grandes multinacionais e do capital financeiro.



Mas mais grave ainda é que todo o Governo, do 1º Ministro ao Ministro do Trabalho, foi e é cúmplice activo em todo este nebuloso e revoltante processo. O Governo sabia há meses, há meses, como afirmou o Ministro Manuel Pinho, no passado dia 5 de Dezembro, em Aljustrel, e ontem se confirmou no decorrer da audiência agendada potestativamente pelo GP do PCP, de tudo o que se estava a passar.

Sabia há meses que isto ia acontecer e escondeu-o deliberadamente, dos principais interessados, permitiu que a Lundin Mining despedisse centenas de trabalhadores, e tentou ontem, com a cumplicidade de alguns deputados do GP do PS, vender-nos a imagem de um Governo que encontrou de imediato uma solução, como se esta fosse a única e a melhor solução, como se não fosse o Governo, o principal responsável de todo este escabroso processo e não tivesse a obrigação de intervir de imediato no sentido de impedir o despedimento colectivo que entretanto a multinacional Lundin Mining consumou.

Que hipocrisia a do Ministro dito do Trabalho e da Solidariedade Social, Vieira da Silva, ir dar palmadinhas nas costas dos mineiros, no dia 14 de Novembro, em Beja, quando já sabia há meses o que se estava a passar e nada fez para o impedir. Palmadinhas nas costas? Não! Punhaladas nas costas, isso sim, foi o que fizeram o Ministro Vieira da Silva e o Governo aos mineiros de Aljustrel.

Mas que dizer da milagrosa solução agora encontrada e cujos contornos estão longe, muito longe, de estar esclarecidos?

Vejamos:
Logo no dia 13 de Novembro à tarde o Ministro Manuel Pinho afirmava que havia um "grupo internacional" de investidores "muito interessado" na compra das Pirites. José Sócrates confirmou o mesmo no dia seguinte mas já o Governador Civil de Beja avançava no mesmo dia o nome do Grupo Martifer dos irmãos Martins onde a Mota/Engil detém 50% das acções e onde trabalha hoje o ex-Director da Direcção Geral da Energia e Geologia, Miguel Barreto. Por sua vez o Presidente da Martifer, Carlos Martins, desmentia no mesmo dia a compra afirmando que o sector mineiro não fazia parte "do seu core business" mas assumindo que "esteve nas instalações das Pirites" algumas semanas antes "para analisar a compra da empresa".
No dia 5 de Dezembro, depois de muito secretismo, Manuel Pinho foi a Aljustrel anunciar que o grande negócio era feito com a MTO, empresa dos irmãos Martins, do Grupo Martifer onde a Mota/Engil é dominante.

A isto é que se pode chamar com toda a propriedade "tirar um grande coelho da cartola". Que grande passe de mágica.

O Senhor Ministro jurou ontem a transparência de todo o processo mas a verdade é que o processo se torna cada vez mais nebuloso e opaco com a recusa assumida, mais uma vez, da entrega dos documentos já requeridos por várias vezes pelo GP do PCP. Se tudo está tão claro, se tudo está transparente, se tudo está na Internet, então porquê esta fuga à entrega da documentação, contratos e adendas anexas, relativa aos negócios do Estado com a Eurozinc envolvendo as Pirites e a Somincor? Porquê invocar a existência de cláusulas de confidencialidade que constarão nessa documentação e que não permitirão a sua entrega aos Deputados da Assembleia da República? Porquê o silêncio face às múltiplas e pertinentes perguntas que lhe foram ontem colocadas? Afinal o que esconde o Governo de tão grave em toda estas negociatas?

Porque desta fuga ao controlo e fiscalização democrática da Assembleia da República, aos negócios do Governo envolvendo recursos públicos, só uma de duas conclusões se pode retirar: ou a aceitação de compromissos espúrios e inconfessáveis em que não queremos acreditar ou a incompetência e a gestão negligente e danosa dos recursos do País.

Se havia compromissos da Lundin Mining de criar 250 postos de trabalho directos e 450 indirectos como foi repetidamente afirmado, se havia compromissos de manter a laboração por um mínimo de 10 anos como veio a público, se havia compromissos de investimentos e por isso beneficiou de facilidades e contrapartidas financeiras do Estado Português, se rompeu arbitrariamente com todos estes compromissos, a postura do Governo nunca poderia ser a de uma postura subserviente e cúmplice face à multinacional como a que tem tido até ao dia de hoje.

O cabal esclarecimento de tudo isto continua a impor-se! Os interesses dos trabalhadores e do País assim o exigem.

Disse.


Comentário

Mais uma vez, o que é verdade hoje pode não o ser amanhã; o que podia não ser um objectivo ontem, pode muito bem sê-lo hoje; o que não se pensava ontem, não é bem o que se pensa hoje.

Nada de grave seria, não se tratasse da vida de centenas de pessoas e do futuro de dois concelhos de uma das zonas mais economicamente retraídas da Europa.

É assim que o Partido Socialista trata dos interesses do Alentejo.

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